alguém me disse certa vez que depois que inventaram desculpas, todo mundo acha que pode viver errando. eu não acredito nisso. acho que pedir desculpas só é suficiente quando o erro não se repete mais. pedir desculpas é se redimir, é baixar a cabeça e admitir que andou fazendo (pensando) o que não era certo. e por isso eu não quero pedir desculpas, porque sei que elas vão soar no seu ouvido como um filme de sessão da tarde: repetitivo, você já sabe o final. eu escrevo uma cartinha colorida, passo uma tarde na sua casa, choro no seu ombro, depois a gente ri, se abraça e fica tudo bem por um certo tempo. mas aí as coisas voltam a ser como eram antes algumas semanas depois. ok, eu também já vi esse filme e não quero convidá-la pra assistir novamente.ontem cheguei cedo em casa, deitei na cama e fiquei olhando pras minhas fotos. há bem pouco tempo atrás elas não estavam ali me fazendo companhia e eu percebi quanta coisa mudou nesses últimos tempos. andei fazendo trocas inconscientes e quando percebi já havia afastado de mim um sem número de hábitos, coisas e pessoas. hoje meu telefone não toca mais insistentemente nos finais de semana, meu celular muitas vezes passa o dia desligado, minha caixa de e-mails nunca está lotada e eu tenho produzido mais no colegio. tenho bem mais amizades virtuais que reais, troquei as baladas alternativas por finais de semana em casa, as conversas jogadas fora por um livro, um filme ou um CD novo, os problemas de outrora pela calmaria da minha paz. eu estou bem comigo mesma, estou dando valor a coisas que eu simplesmente ignorava. tracei minha vida, determinei horários, estudo quando devo, converso quando quero, escrevo quando preciso. hoje tenho liberdade de sair do colegio e ir bater perna por aí se estiver com vontade, de andar sozinha pelas ruas e entrar em lojas baratas pra comprar bobagens, comer pastel de carne até doer, tomar um ônibus diferente pra ir pra casa. fazer o que eu quero fazer. os problemas ainda estão lá, é verdade, mas eles agora só me perturbam nos malditos dias de TPM ou quando algum fator externo me faz lembrá-los, coisas que eu não posso controlar. no início foi complicado, eu achei que estava deprimida novamente. não tinha vontade de sair ou ver ninguém, passava dias inteiros enfiada no quarto lendo, cantando ou simplesmente dormindo e vinha estudar na segunda feira com a sensação de que não tinha feito nada que se aproveitasse de verdade. os telefones tocavam e eu ignorava. os convites vinham e eu inventava uma desculpa qualquer. uma preguiça de viver que me machucava mais do que me fazia bem. as cobranças começaram. quem realmente se importava me cobrou presença. um outro tanto simplesmente sumiu após algumas negativas minhas. e foi aí que eu precisei de alguém pra ouvir um texto novo que eu havia escrito, pra ir pro cinema comigo ver aquele filme que havia estreado, pra falar das coisas do mundo que pareciam mortas pra mim. mas eu não movi um músculo. não fiz qualquer movimento pra mudar isso. continuei lendo sozinha em voz alta os meus textos novos, ou algum interessante que eu encontrava na internet, deixando os cinemas de lado, matando ainda mais as coisas do mundo. e o mais engraçado disso tudo é que eu me sentia bem. eu não sentia falta. o que eu mais queria era ir pra casa no final do dia e assistir a novela das sete e depois ir dormir cedo com o mp4 repetindo a mesma musica. eu me acostumei ao que antes me incomodava e fiz disso a minha nova vida. eu mudei. mudei mais rápido do que pude perceber e eu não escolhi isso. não foi algo que eu decidi, tipo, acordei hoje e agora quero ser assim. não. aconteceu. quando me dei conta muitas de minhas mudanças já tinham ocorrido de forma irreversível. afastei você e outras tantas pessoas que importavam pra mim da minha vida e não deixei que ninguém mais entrasse nela e eu nem se quer percebi isso. claro que as mais insistentes ainda estão por aqui e a elas eu devo muito. afinal, elas aceitaram todos as minhas recusas, brigaram comigo diversas vezes, bateram o telefone na minha cara ou deixaram mensagens grosseiras na minha caixa postal, mas nunca deixaram de me procurar quando sentiram a minha falta. elas aceitaram as minhas crises e a minha nova realidade a duras penas, no meio de conversas sem argumentos e muitas lágrimas pra preencher o que eu não conseguia explicar. elas foram na minha casa, me arrastaram pelo braço e me mostraram que ainda existia vida lá fora, além do meu mundinho pessoal. e eu não quero e nem posso cobrar isso de você porque as pessoas são diferentes. eu não tenho esse direito. a sua vida seguiu a parte de mim e sei que volta e meia a gente se perguntava: ‘o que foi que aconteceu com a gente?’ ‘onde foi que eu errei, afinal?’ hoje eu só queria te dar essas respostas. você não errou. você esperou. eu não errei. eu mudei. nossos caminhos se abriram e a gente tomou outros rumos. hoje eu sou uma pessoa que você não consegue entender, mas que quer manter ao seu lado. hoje você é uma pessoa que eu sempre consegui entender e que ainda quero, sim, ao meu lado. mudar não é fácil, muito menos quando não se espera. as pessoas se afastam de você, não te entendem, cobram que você ressuscite seja lá de onde se perdeu. mas eu mudei e não escolhi isso. existem coisas que não me interessam mais e outras tantas que me incomodam e isso nada tem a ver com o seu comportamento ou com o de quem quer que seja. só tem a ver comigo, com o que eu penso e com o que eu acredito. eu não sei o nome do que aconteceu comigo, nem sei se tem volta, tampouco se ainda existe em mim pedaços daquela menina que você conheceu há a tanto tempo atras. não sei se essa é mais uma crise que eu estou passando e que logo vou acordar e tudo vai voltar a ser como era antes. não posso pedir pra você entender o que nem eu mesma entendo.
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Kamila Rocha
às
05:48